A política a favor das mulheres durante a revolução. A emancipação da mulher: uma exigência revolucionária.

Por Kakiswendépoulmdé Marcel Marie Anselme LALSAGA, via Thomas Sankara, traduzido por Vinícius de Araújo

O CNR[1] considerava a emancipação da mulher como uma necessidade para o aprofundamento do processo revolucionário: “A Revolução e a emancipação da mulher caminham lado a lado. E não é um ato de caridade ou um impulso de humanismo falar da emancipação da mulher.É uma necessidade fundamental para o triunfo da Revolução. As mulheres carregam dentro delas a outra metade do céu”. (CNR, 1983, Discursos de orientação política, Ouagadougou, Ministério da Informação, pagina 36, ver o discurso em https://www.thomassankara.net/discours-d-orientation-politique-2/). Essa concepção da Revolução feminina esteve na origem de uma verdadeira mudança de mentalidades que colocou a mulher no centro da vida política e socioeconômica, tornando-a uma protagonista no projeto de desenvolvimento. Em um país onde as mulheres eram condenadas a serem coadjuvantes pela rotina costumeira, a política feminista do CNR constituiu uma profunda redefinição das relações de gênero. A complementaridade entre homens e mulheres foi celebrada como um grande valor para o enraizamento da Revolução. Em geral, foi uma política que envolveu decisivamente as mulheres na luta coletiva revolucionária para desenvolver Burkina Fasso. Nossa preocupação nesta parte de nosso trabalho é compreender o alcance e a qualidade das iniciativas do CNR com o apoio dos CDRs[2] para a emancipação da mulher.

A criação do DMOF e da UFB

A ideia de criar uma organização feminina para o progresso das mulheres nasceu rapidamente no nível do CNR. Os fundamentos desta organização foram lançados com a criação da Direction de la Mobilisation et de l’Organisation des Femmes (DMOF) — Direção da Mobilização e da Organização das Mulheres — em outubro de 1984, uma estrutura diretamente ligada ao SGN[3]-CDR, que assegurou seu funcionamento.

A DMOF foi concebida para ser uma estrutura de reflexão e ação com o objetivo de alcançar o verdadeiro desenvolvimento das mulheres burquinenses. Serviu como um primeiro canal para o governo destacar sua política em favor das mulheres. De 1 a 8 de março de 1985, foi realizada a Semana Nacional da Mulher em Ouagadougou. Graças ao trabalho da DMOF, mais de 300 mulheres de todos os estratos sociais de Burkina Faso se reuniram para refletir sobre os problemas que as mantinham em circunstâncias difíceis.

Nesta ocasião, três comissões principais conduziram reflexões e propuseram resoluções para melhorar a condição feminina. Uma comissão refletiu sobre a situação jurídica das mulheres, especialmente em nível familiar, e apresentou a ideia de elaborar um Código de Família. A segunda comissão tratou do direito das mulheres à educação e defendeu a alfabetização e a escolarização generalizada para as mulheres. A terceira comissão concentrou-se no lugar das mulheres na construção econômica e social do país.

No intuito de tornar o trabalho da DMOF mais eficiente, a SGN-CDR criou a UFB[4] em setembro de 1985, que foi estruturalmente anexada aos CDRs. A diretriz que instituiu a UFB afirmou expressamente que era uma extensão dos comitês do CDR (Capitão Pierre OUÉDRAOGO, “Diretriz da Secretaria Geral da CDR sobre a criação da Organização das Mulheres” em Sidwaya n° 359 de 23 de setembro de 1986, página 2). Esta dependência da UFB em relação aos CDRs ainda era visível nas disposições estatutárias, que foram diretamente modeladas no estatuto geral dos CDRs.

A dissolução da DMOF no final de 1986 decapitou a UFB, que se perdeu em desordem. Thomas SANKARA anunciou a criação de um gabinete nacional em 8 de março de 1987, mas este gabinete se mostrou ineficaz. As negociações alimentadas por calúnias e mesquinharias, rivalidades e brigas de precedência mantiveram a UFB em estado de disfunção até 15 de outubro de 1987 (Ludo MARTENS, 1989, Sankara, Compaoré e a Revolução Burquinense, Berchem, EPO Internacional, páginas 27 e 28).

O governo tinha uma clara responsabilidade pelas disfunções da organização das mulheres. Deve-se questionar a ligação intrínseca da UFB ao CDR. Esta subordinação foi uma fonte das dificuldades da UFB e, em vez de as libertar, manteve as mulheres em um certo confinamento político. Podemos retomar esta declaração de duas lideranças da UFB logo após o dia 15 de outubro: “Na UFB, nós não estávamos mais no comando de nossa ação. Os líderes do CNR passaram por cima dos líderes da UFB para dar instruções às bases” (observações de Véronique KANDO e Madeleine OUÉDRAOGO relatadas por Ludo MARTENS, 1989, idem, página 23).

Da mesma forma, Alima TRAORÉ afirmou: “A Secretaria Geral Nacional nos considerava como uma estrutura subordinada que ela controlava de perto. No papel, fomos responsáveis pela coordenação de todas as ações das mulheres, mas nos foi negado os meios políticos para realizá-las. Para cada ação que queríamos executar, precisávamos da aprovação da Secretaria Geral. Assim, muitas iniciativas foram exterminadas, nos tornamos cada vez mais uma estrutura administrativa e burocrática” (observações de Véronique KANDO e Madeleine OUÉDRAOGO relatadas por Ludo MARTENS, 1989, idem, página 23).

Finalmente, os líderes do CNR estavam trabalhando para minar a independência efetiva das mulheres. Desde o discurso profundamente feminista até a ação, a contradição era flagrante.

Entretanto, isto não é motivo para desmerecer todo o trabalho empreendido pela CNR em favor das mulheres, primeiramente através da DMOF e depois da UFB. Esta política teve a virtude de ter suscitado uma real tomada de consciência do papel indispensável da mulher na sociedade e da necessidade de sua participação na construção de uma sociedade próspera. Apesar de todas as suas deficiências, trata-se de uma política que trouxe uma verdadeira mudança de mentalidades em direção a uma visão mais justa sobre a mulher. Nenhum governo de Burkina Faso havia investido tanto nesta causa tão justa.

A batalha pela emancipação econômica da mulher

O CNR considerava que a emancipação das mulheres envolvia necessariamente sua independência econômica. Entretanto, as mulheres foram praticamente excluídas da atividade econômica moderna, e apenas 5% das mulheres estavam empregadas em empresas privadas em 1983 (observações de Véronique KANDO e Madeleine OUÉDRAOGO relatadas por Ludo MARTENS, 1989, Sankara, Compaoré e a Revolução Burquinense, Berchem, EPO International, página 26). Em muitos setores da vida profissional, as mulheres eram marginalizadas com base em noções pré-concebidas de sua inferioridade e de sua incapacidade de produzir algo positivo. A situação era mais crítica por causa dos baixos níveis de escolaridade e alfabetização que afetavam predominantemente as mulheres. Em resumo, a situação econômica geral das mulheres era impraticável. Para o CNR, a responsabilidade por esta precariedade econômica recaía sobre os regimes anteriores, que eram conhecidos pelos sistemas de exploração que haviam colocado em prática. A necessidade de promover a independência econômica das mulheres tornou-se assim uma missão instigante para a CNR.

Sendo assim, o CNR abriu cargos políticos para as mulheres. Durante muito tempo, essas responsabilidades pareciam estar reservadas aos homens. O caso mais notável desta abertura foi a entrada das mulheres na equipe governamental em vigor. A partir de 1984, as mulheres receberam pastas ministeriais chave, uma inovação extraordinária que sem dúvida foi concebida para mudar mentalidades: administrar um ministério não é apenas um privilégio dos homens, as mulheres também podem fazê-lo, e até melhor. Era um claro anseio, portanto, de desmantelar um sistema sectário e sexista que, segundo o entendimento do CNR, era bem adequado aos regimes capitalistas do passado. Assim, quando o governo foi renovado em agosto de 1984, três mulheres tornaram-se ministras: Adèle OUÉDRAOGO para o Orçamento, Rita SAWADOGO para Esporte e Lazer, e Joséphine OUÉDRAOGO para o Desenvolvimento Familiar e Solidariedade Nacional. Em 1986, o número de mulheres na equipe do governo aumentou para cinco. Quatro mulheres também se tornaram altas comissárias: Aïcha TRAORÉ em Passoré, Eve SANOU em Sanguié, Béatrice DAMIBA em Bazèga e Germaine PITROIPA em Kouritenga.

A guerra ao exclusivismo profissional contra as mulheres foi assim deflagrada, e foi até mesmo admirada devido à natureza extraordinária das ações tomadas. As mulheres têm as mesmas habilidades que os homens. A título de exemplo, cinco mulheres foram treinadas como pedreiras e contratadas pela construtora GDEIRI (Ludo MARTENS, 1989, Sankara, Compaoré e a Revolução Burquinense, Berchem, EPO International, página 26). Em Ouagadougou, 38 mulheres, na maioria analfabetas, haviam aprendido a dirigir veículos pesados (Ludo MARTENS, 1989, página 26).

Ao mesmo tempo, os CDRs criaram empresas artesanais em benefício da auto-suficiência econômica das mulheres. Por exemplo, no Setor 22, a ONG Sahel-solidarité subsidiou, com a ajuda dos CDRs, a criação de uma unidade de produção de sabão e manteiga de karité; a venda destes produtos destinava-se a abastecer os cofres de uma cooperativa criada pela UFB (Ludo MARTENS, 1989, página 26). Infelizmente, os membros compartilharam os lucros deste trabalho às custas dos fundos coletivos. Isto levou à desassociação das mulheres do grupo. Estes últimos, após terem sido bem treinados, optaram pela experiência individual (Ludo MARTENS, 1989, página 26).

Esta falência não significa, entretanto, que todas as empresas iniciadas tenham fracassado. Felizmente, houve alguns resultados satisfatórios. No Setor 30, os CDRs obtiveram um moinho de grãos no valor de 5 milhões de francos CFA graças às contribuições sub-setoriais e financiamento de uma ONG, cuja operação gerou lucros que os CDRs usaram para comprar uma descascadora a um custo de 350.000 francos CFA (Ludo MARTENS, 1989, página 26). Eles também planejaram a criação de um centro comercial para mulheres. Um último exemplo de uma iniciativa foi a criação do restaurante Yidigri em Ouagadougougou. Este restaurante, cujo nome (em Moore) significava “florescimento” foi encorajado pelas autoridades. Por exemplo, na quarta-feira 3 de dezembro de 1986, Thomas SANKARA, após o Conselho de Ministros, havia convidado seu governo para a refeição da noite neste restaurante (L’Intrus n°0024 de 5 de dezembro de 1986, “Vivre avec les masses ou bouffer avec les masses?”, página 7). De modo geral, a criação de empresas em favor das mulheres atingiu todo o território nacional onde os CDRs existiam. Entretanto, na opinião de alguns observadores, estas empresas obtiveram pouco sucesso.

Esta é a opinião, por exemplo, de Sylvy JAGLIN, que sustenta que estas empresas, devido a seu aspecto embrionário e seu destino incerto, pouco se beneficiaram da mobilização da população, o que gerou obstáculos à capacidade dos CDRs de supervisionar adequadamente o desenvolvimento local (Sylvy JAGLIN, 1994, Gestion urbaine partagée à Ouagadougou: pouvoirs et périphéries (1983-1991), Paris, Karthala, página 339). No entanto, a iniciativa de todas essas empresas deve ser elogiada, pois, além de progressos materiais e financeiros, ela desfez uma psicologia sexista que há muito vinha sendo destilada pelas tradições ancestrais e liberou a energia produtiva que havia sido mantida adormecida nas mulheres.

Esforços muito louváveis foram feitos para facilitar o acesso das mulheres à educação. A matrícula de jovens meninas na escola decolou como nunca antes. Ao mesmo tempo, os CDRs e a organização de mulheres incentivaram as mulheres analfabetas a fazer cursos de alfabetização. Esta extensão da educação às mulheres tinha como objetivo fortalecer a capacidade das mulheres de serem as arquitetas de seu próprio desenvolvimento econômico, o que fortaleceria a revolução.

Em 1985, o governo tentou introduzir o chamado salário vital para ajudar economicamente as mulheres. A ideia era deduzir uma soma para suas esposas no final de cada mês diretamente do salário de seus maridos. Esta medida “foi justificada pelo fato de que os problemas ligados, em particular, à desagregação da família tradicional e as consequências psicossociologias resultantes levaram muitos pais a se entregarem ao alcoolismo ou a manter “amantes”, deixando suas esposas e filhos praticamente indigentes” (Christine BENABDESSADOK, 1985, “Femmes et révolution: comment libérer la moitié de la société” in Politique africaine n° 20, Le Burkina Faso, Paris, Karthala, página 62). Sobre este fenômeno, Thomas SANKARA declarou: “o Estado não obriga ninguém a se casar, mas exige que a pessoa que funda um lar assuma suas responsabilidades […]”. Há homens que transformam suas esposas em empregadas domésticas, recusando-se, no entanto, a dar-lhes um salário de empregada e desperdiçando o dinheiro da casa em trivialidades. O que do ponto de vista da simples moralidade é imoral, para a Revolução Democrática e Popular é inaceitável” ( ler o discurso de Thomas SANKARA no Ano II do DPR em Sidwaya n°327 de 06 de agosto de 1985, p.p. 1 – 5. O discurso está disponível gratuitamente online em https://www.thomassankara.net/susciter-lhomme-de-la-liberte-contre-lhomme-du-destin-discours-de-thomas-sankara-4-aout-1985/).

O salário mínimo vital havia suscitado as esperanças de muitas mulheres, mas mal foi implementado devido à maior resistência dos homens à sua instituição. Estes últimos já estavam descontentes com o número crescente de mulheres à frente das instituições públicas do Estado (Richard BANÉGAS, 1993, Insoumissions populaires et révolution au Burkina Faso, Bordeaux, CEAN, página 73). “A ideologia feudal persiste; as mulheres são menores, devem ser dominadas pelos homens” (Ludo MARTENS, 1989, Sankara, Compaoré et la Révolution burkinabè, Berchem, EPO Internacional, página 23). Além dessas medidas socioprofissionais, a libertação da mulher também significou o resgate de sua dignidade. O respeito a esta dignidade foi a realização plena da importância da mulher na sociedade. Neste sentido, o CNR se comprometeu a lutar contra a prostituição.

Doutor Kakiswendépoulmdé Marcel Marie Anselme LALSAGA (KAMMANL), “Etat, Révolution et transition démocratique au Burkina Faso: le rôle des structures populaires révolutionnaires de l’avènement de la Révolution Démocratique et Populaire (RDP) à la restauration de la République”, tese de doutorado em História Política e Social, p.p. 418- 421.

A luta contra a prostituição

A moral revolucionária considerava a prostituição como uma prática degradante e intolerável em uma sociedade que cultivava a integridade moral. Entretanto, esta prática estava muito presente nos centros urbanos, especialmente na cidade de Ouagadougou. Segundo um censo realizado pelos CDRs em nove setores, 629 prostitutas, das quais 86% eram estrangeiras (ganensas e togolesas), estavam envolvidas em dois tipos de prostituição na cidade de Ouagadougou: a prostituição profissional praticada por estrangeiros e prostituição ocasional praticada por burquinenses (CNR, SGN-CDR, 1986, Relatório dos trabalhos da primeira conferência nacional dos CDRs de Burkina Faso, página 90). A amplitude da prostituição, especialmente da prostituição profissional, foi tal que Bruno JAFFRÉ a descreveu miseravelmente nestes termos: “Uma prostituição particularmente miserável. Mulheres jovens, na maioria das vezes ganensas ou togolesas, sentadas em frente a uma pequena sala escondida por uma cortina, esperavam por clientes que lhes trouxessem bilhetes de 200 a 400 francos CFA no máximo. Eles eram chamados de “tabourets” (porque se sentavam em bancos — “tabourets” — na frente de suas portas para esperar pelos clientes)” (Bruno JAFFRÉ, 1989, Burkina Faso, les années Sankara: de la Révolution à la Rectification, Paris, L’Harmattan, página 31).

A partir de 1985, a CNR se comprometeu a combater este flagelo que era uma vergonha para a sociedade burquinense. Ela definiu a prostituição como uma norma de exploração que estava de acordo com o sistema capitalista. Era por haver injustiças na sociedade que a prostituição era praticada. Era, portanto, fundamental criar uma nova sociedade de justiça e igualdade. A construção desta sociedade era inseparável da luta contra o flagelo da prostituição.

Thomas SANKARA acusou os homens de serem responsáveis pela prostituição; as mulheres eram vistas apenas como vítimas. Em seu discurso de 8 de março de 1987, ele declarou: “A prostituição […] nada mais é do que a essência de uma sociedade onde a exploração da mulher é a regra. Ela simboliza o desprezo do homem pelas mulheres. Desta mulher que não é outra senão a figura dolorosa da mãe, irmã ou esposa de outros homens, incluindo todos nós. É, em última análise, o desprezo inconsciente que temos por nós mesmos. Só há prostitutas onde há ʺprostituidoresʺ e cafetões” (Thomas SANKARA, discurso de 08 de março de 1987: “Libération de la femme, une exigence future” em Bruno JAFFRÉ, 1989, Les années Sankara, página 304).

O CNR empregou os CDRs para realmente lutar contra esse flagelo. Os CDRs ordenaram primeiramente as chamadas operações kokoko, que consistiam em verificações sem aviso prévio de documentos de identidade e certificados de casamento nos bordéis; qualquer mulher sem carteira de identidade verificada entre as 20h e as 2h era presumida como prostituta e mantida em custódia no escritório até que o contrário fosse comprovado (Matthias S. Kansé, “Le CNR et femmes: difficulté de libérer moitié ciel” in Politique africaine n°33, 1989, Retour au Burkina, Paris, Karthala, página 69). Isto levou a uma série de equívocos, o que levou ao abandono destas medidas policiais.

A realização da primeira conferência de CDRs foi uma oportunidade para o CNR projetar sua ação anti-prostituição. Ela defendia ações preventivas, por um lado, e ações curativas, por outro. As ações preventivas consistiram na sensibilização para os riscos da prostituição, na educação sexual nas escolas e setores sociais, na atualização da lei n°11/64/AN de 4 de agosto de 1964, na regulamentação do movimento de menores e na frequência de boates, cinemas, etc., e proibição da exibição de filmes pornográficos (CNR, SGN-CDR, 1986, Relatório dos trabalhos da primeira conferência nacional dos CDRs de Burkina Faso, página 90). Os CDRs locais foram solicitados a aplicar estas medidas.

Quanto às ações curativas, elas deveriam ajudar a encontrar empregos para prostitutas e permitir sua reintegração social (CNR, SGN-CDR, 1986, Rapport des travaux de la première conférence nationale des CDR du Burkina, página 90). O CNR descreveu o desemprego como uma das principais causas da disseminação da prostituição. Era portanto imperativo conceber atividades profissionais para as prostitutas para que elas abandonassem seu “serviço”: “A luta contra o flagelo da prostituição é inseparável da transformação qualitativa e da construção de uma nova sociedade […] na qual os membros florescerão através do exercício de atividades produtivas e mais saudáveis“, declarou Thomas SANKARA em 8 de março de 1986. As atividades propostas foram, entre outras, costura, cortes de cabelo, tecelagem e comércio.

Mas esta opção do CNR curiosamente encontrou a resistência das prostitutas. O próprio SANKARA tentou conscientizar diretamente, mas logo foi ridicularizado. Em uma reunião com as prostitutas, ele delineou um plano para dar trabalho a todas aquelas cuja precariedade de vida as levou a se prostituir. Elas lhe disseram que sua atividade não se limitava à equação financeira; sem dúvida, a necessidade de desfrutar da própria sexualidade tinha que ser levada em conta.

Tendo-as compreendido bem, Thomas SANKARA propôs casá-las. Ironicamente, elas retorquiram que ele tinha os meios para alimentá-las todas, mas não ficou claro que ele pudesse satisfazê-las todas (Ludo MARTENS, 1989, Sankara, Compaoré et la Révolution burkinabè, Berchem, EPO Internacional, página 27).

Apesar desta resistência significativa das protagonistas, as autoridades persistiram em sua determinação e invadiram as áreas da cidade onde a prostituição estava em pleno andamento. Destruiram o distrito de Bilbambili, conhecido por ser o centro da prostituição, como parte da política de urbanização.

O resto da luta foi baseada nos CDRs, que, ao mesmo tempo em que conscientizavam, faziam prisões e denunciavam prostíbulos ou bordéis. O somatório dessas ações deu um golpe decisivo na prostituição, cuja escala pública havia diminuído significativamente. Certamente, o fenômeno não havia sido totalmente eliminado, mas a política moral revolucionária o havia reduzido drasticamente a um estágio em que só podia ocorrer de uma forma mais clandestina.

Finalmente, deve-se notar que em seu desejo de proporcionar uma solução holística para o fenômeno da prostituição, Thomas SANKARA havia planejado organizar um congresso mundial de prostitutas em Ouagadougou (D. BAILLY, “Sankara m’a dit…” em Ivoire Dimanche n° 856 de 5 de julho de 1987, página 14). Com seu assassinato, não só esta projeção não teve sucesso, mas a prostituição em si foi retomada com veemência.

A política de reabilitação da dignidade da mulher como elo essencial da sociedade e agente de desenvolvimento também envolveu uma cruzada contra o fenômeno do casamento forçado, uma prática que estava bem estabelecida em Burkina Faso na época, quando a tradição ainda tinha uma forte influência na sociedade. Doutor Kakiswendépoulmdé Marcel Marie Anselme LALSAGA (KAMMANL), “État, Révolution et transition démocratique au Burkina Faso: le rôle des structures populaires révolutionnaires de l’avènement de la Révolution Démocratique et Populaire (RDP) à la restauration de la République”, tese de doutorado em História Política e Social, p.p. 418- 425.

______

[1] Conseil national de la revolution (Conselho Nacional da Revolução)

[2] Comités de Défense de la Révolution (Comitês de Defesa da Revolução)

[3] Secrétariat général national (Secretaria Geral Nacional)

[4] Union des Femmes Burkinabè (Uniao das Mulheres Burquinenses)

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